Ser grato num contexto de insegurança...
Nos tempos mais recentes da história da humanidade nunca se falou tanto globalmente de insegurança como no presente contexto covid 19. No entanto, em verdade sempre vivemos na insegurança e esta situação da pandemia apenas nos veio evidenciar isso.
O ser humano sempre quiz saber qual o sentido da sua existência e tal preocupação decorre do fato de ser o único ser na terra com a consciência da sua própria mortalidade. Foi na sequência desta insegurança que surgiu a teologia para tentar criar consolo, segurança e conforto - através de uma certa noção de Deus como um pai que vai cuidar de si e vai decidir tudo. Foi também nesta sequência que surgiu a ciência para fornecer ao homem a noção pragmática de que lhe fornecerá todas as respostas e desmistificará tudo. Logo você não precisa de se preocupar pois a ciência vai descobrir todos os mistérios. A própria filosofia também se propôs desmistificar a existência...
Só que "nenhum esforço do homem pode desmistificar a existência (...) Da mais pequena pedra na praia a todo o universo, tudo é tão misterioso que não há possibilidade de o conhecer." - Osho- "Inocência, conhecimento e deslumbramento".
É preciso coragem para aceitar a insegurança e para a festejar.
Dizemos que a história se repete, e isso é verdade porque a generalidade das pessoas vive robóticamente e rotineiramente. Se aceitarmos a insegurança da vida e também o facto de não termos o conhecimento de tudo, estaremos mais próximos de uma existência mais iluminada.
A insegurança da vida é o que faz com que cada dia seja diferente, mesmo com as nossas rotinas estabelecidas... Isso é o sal e o açucar da vida. Já viu como seria a sua vida se todos os dias fossem exactamente iguais? Seguros e repetidos incessantemente? Mais ou menos o que estamos a vivenciar com o confinamento e isolamento social... Falta qualquer coisa...
Há vários filmes que retrataram esta possibilidade da repetição dos dias, e há um em particular que venho aqui comentar : O Feitiço do Tempo, da Columbia Pictures, com Bill Murray e Andy MacDowell. Este é o seu enredo:
Nevou durante uma viagem a Punxsutawney, Pensilvânia, para cobrir as festividades do Dia da Marmota. O metereologista Phil Connors (Bill Murray) vê-se preso no tempo, repetindo intermináveis vezes o dia 2 de fevereiro. O seu mundo é habitado pelas mesmas pessoas todos os dias, mas eles não sabem que o dia está a repetir-se. Isso dá-lhe uma certa vantagem. Ele pode descobrir o que uma mulher procura num homem, e então no "próximo" dia comportar -se exatamente do jeito certo para impressioná-la. Felizmente, há uma mulher por perto para praticar. Ela é Rita (Andy MacDowell), produtora de Phil, que tem de aguentar os seus ataques, exigências e mau humor. Pouco a pouco Phil consegue ver os seus erros e melhorar o seu comportamento até que, finalmente, o Dia da Marmota amanhece quando ela realmente gosta dele
Este filme é mesmo interessante e divertido pois evidência bem como seria mónotono reviver conscientemente o mesmo dia incessantemente. Para os restantes personagens que não tem essa consciência não existe esse sentimento de monotonia, mas para a personagem principal não é assim. E o que o que causa a repetição incessante do mesmo dia? O fato do protagonista cometer diversos erros que impedem que a protagonista se interesse amorosamente por ele. Erros do EGO, lá está. Só quando ele abandona o seu carácter egóico e apaixona-se verdadeiramente por ela e é correspondido, o dia deixa de se repetir!
Assim é com cada um de nós! Repetimos incessantemente o mesmo tipo de erro, e quando aprendemos a lição subjacente, surge outro desafio ou aspecto da vida a requerer a nossa atenção! E assim avançamos, passo a passo, pedra entre pedra...
Reportando-nos ao contexto atual, creio estar certa quando digo que ninguém no seu pleno juízo quererá esta doença - neste caso pela forma de um vírus. Isto não é fantástico!
Porém, esta pandemia veio dar-nos uma possibilidade de reflectir acerca destas questões e de nos fazer redefinir prioridades e pode ensinar-nos, se tivermos abertura para tal, a valorizar tanta coisa que antes não davamos grande valor...
Como hoje comentava com uma amiga, é absurdo viver em pânico e totalmente subjugado pelos acontecimentos. Mas também é igualmente negativo, ser um inconsequente e não medir os perigos. Entre estes dois extremos deve existir um meio termo...
Tenha presente isto: a insegurança é um fato da vida, exista ou não pandemia. Assim, aprenda a desfrutar mais da vida, aprenda a reflectir e a pensar pela sua própria cabeça e não vá na onda das massas.
"É uma grande benção que a vida seja insegura, que o amor seja inseguro e que estejamos fundamentalmente num estado de desconhecimento. Nós podemos ser como crianças - Apanhar borboletas, conchas na praia ou pedrinhas coloridas como se fossem diamantes e desfrutar tudo isso". Osho - "Inocência, conhecimento e deslumbramento".