De Olhos Fixos no Sol
Todos enfrentamos o mesmo terror, a ferida da mortalidade, a minhoca que habita no coração da existência.
Irvin D. Yalom
Um livro que me custou imenso ler... E no entanto, um livro que me ensinou muitíssimo e que me ajudou a encerrar um luto e a encarar a existência de outra forma. Li-o após perder o meu pai.
Alerto que até à página 58 o livro pode ser muito deconfortável...
E porquê que este livro pode ser tão perturbador para algumas sensibilidades?
1.º Porque é um livro sobre a morte... Aquele grande tabu da humanidade e porventura o nosso maior medo: encarar a nossa própria mortalidade e a de todos os que nos rodeiam e amamos;
2.º Porque o autor é psiquiatra e o livro tem muitas histórias dos seus pacientes, usadas para ilustrar alguns pontos de vista. E isso torna-o terrívelmente pessoal. Sabemos que não é uma ficção. São histórias reais de angustias, medos, culpas que povoam a mente humana e acabamos por nos espelharmos nelas.
3.º Porque o autor, tal como eu, é existencialista, isto é, considera que a nossa existência será sempre assombrada pelo facto de sabermos que iremos crescer, florescer, e inevitávelmente, murchar e morrer. E assim, tem um enfoque de procurar entender o sentido da vida e da morte - pois são face da mesma moeda.
4.º O autor não é nem religioso nem espiritual, o que torna a sua abordagem deste tema particularmente interessante, despojada de crenças... Acaba por satisfazer muitas das dúvidas dos ateus, agnósticos e também (espante-se) dos espiritualistas!
Algumas passagens interessantes deste livro:
- Referindo-se a Heidegger refere que podemos assumir dois modos de existência: o ontológico e o comum. No ontológico o enfoque está no SER em si mesmo e maravilhamo-nos com o facto de sermos e que as coisas sejam. No comum estamos maravilhados pela forma como as coisas são no mundo. O exemplo que dá é a sua experiência com doentes oncológicos e como estes ao enfrentarem a morte passavam a viver como se cada dia fosse o último, fazendo o que gostavam , alterando prioridades, comunicando mais com quem amavam, valorizando mais as estações, a natureza e diminuindo o medo pela própria morte - passam a viver no estado ontológico.
- Refere que a ansiedade pela morte é maior quanto menos vivida for uma vida.
- A morte como sendo o NADA (sem céu, paraíso, mundo espiritual ou o quer que seja). Refere que tem pessoas que temem o NADA e já outras temem a VIDA ETERNA representada pelas religiões e sendo precedida por um terrível julgamento.
Para os que tem medo do NADA ( eu pessoalmente tinha), parafraseia Epicuro: Porquê temer a morte quando nunca teremos consciência dela? Porque estamos mortos, não sabemos que estamos mortos, e, nesse caso, de que temos receio?
Fala também do efeito rippling. Ter uma vida com propósito e deixar um legado é uma forma de perpetuarmos a nossa própria existência. Um legado não precisa de ser material, pode ser imaterial (livros, amigos, uma causa que criou ou apoiou, legado artístico).
Em relação aos que temem a VIDA ETERNA, sugere que se foquem antes na sua vida presente neste mundo, a única que deve de ser plenamente vivida e na qual está a traçar as traves-mestras que o sustentam, dependendo únicamente de si mudar o que não lhe agrada.
- Um ideia extraordinária é a de que a qualidade da nossa vida é determinada pela forma como interpretamos as nossas experiências , e não pelas experiências em si - uma doutrina que veio dos estóicos, a Zeno, Séneca, maro Aurélio, Espinoza, Schopenauer e Nietzche, bem como a teoria cognitivo-comportamental.
- A conectividade, as relações que se estabelece são o maior presente que se pode dar a qualquer pessoa que enfrente a morte.
- Realizar o seu potencial como ser humano reduz a ansiedade de morte. Logo, evite adiar sonhos, projectos.
- Refere que a nossa vida não está escrita ou predefinida e cabe a cada um de nós procurar uma existência com maior propósito, significado e ser feliz.
Maravilhoso, não concordam?
Se tiverem interesse pelo tema, não deixem de ler este livro riquíssimo que além destes aspectos que destaquei tem muitas outras reflexões interessantes.
Boa semana!